sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Canto XX


PURGATÓRIO


Canto XX

           
            Logo nos primeiros versos deste Canto, ambientado ainda no terraço dos avarentos, deparamo-nos com diversas imagens. Isso ocorre talvez para compensar o caráter mais prosaico dos versos, em que se arrola o que os penitentes ouvem, a saber, três exemplos de desprendimento material e generosidade, virtudes opostas à avareza/cobiça (estímulos à virtude oposta) e sete casos de avarentos malsucedidos em decorrência de seu pecado (freios a este), seguindo um padrão adotado desde o início do “Purgatório”. 

            Assim, já no primeiro terceto do Canto, para mostrar que ainda tem muita curiosidade e gostaria de continuar conversando com o papa Adriano (cf. final do canto precedente), Dante afirma:  “por isso contra o meu desejo, para agradar-lhe,/ tirei da água a esponja não saciada” (onde contra ‘l piacer mio, per piacerli,/ trassi de l’acqua non sazia la spugna- v.2-3). Como se vê, a imagem da esponja encharcada associa-se à sua curiosidade satisfeita... Na sequência, os versos dizem que os dois poetas procuravam avançar junto à rocha, ou à encosta da montanha (naquele chão juncado dos corpos dos penitentes)

ché la gente che fonde a goccia a goccia
per li occhi il mal che tutto ‘l mondo occupa,
da l’altra parte in fuor troppo s’approccia.     (XX, 7-9)

pois a gente que verte, gota a gota,/ pelos olhos, o mal que recobre todo o mundo / se aproximava demasiado da borda.

            O mal que recobre todo o mundo é naturalmente a avareza, “vertida” nas lágrimas dos penitentes...Estes jaziam (de bruços) mais próximos da borda do terraço.

            No terceto seguinte, surge uma outra imagem, a da loba, símbolo da avareza, que Dante amaldiçoa. Ela já aparecera antes, no primeiro canto da “Comédia”, com o mesmo significado destes versos:

Maladetta sie tu, antica lupa,
che più che tutte l’altre bestie hai preda
per la tua fame sanza fine cupa!    (XX, 10-12)

Maldita sejas tu, antiga loba,/ que fazes mais presas do que todas as outras bestas,/ pela tua fome profunda, sem fim

G. Doré- Os avarentos

            Dante ouve então uma voz gritar—“Doce Maria!” (Dolce Maria!- v.19) – que se  eleva acima do choro dos que purgam ali seu pecado e ouve também alguém mencionar a pobreza dela, que depôs seu “santo fruto” (portato santo- v. 24) numa manjedoura.

            Depois, escuta:

/.../  “O buon Fabrizio,
con povertà volesti anzi virtute
che gran ricchezza posseder con vizio”.   (XX,  25-27)

/.../ “Ó bom Fabrício,/ preferiste a virtude com pobreza/ à grande riqueza com vício

            E antes que o poeta localizasse, dentre os inúmeros espíritos que ali jaziam, qual era o que assim se manifestava, ouve-o ainda dar um terceiro exemplo de desapego pelos bens materiais e de falta de cobiça:

Esso parlava ancor de la larghezza
che fece Niccolò a le pulcelle,
per condurre ad onor lor giovinezza.     (XX, 31-33)

Ele falava ainda da generosidade/ de Nicolau para com as donzelas/ de modo a poderem guardar sua juventude honesta. 
     
Amos Nattini
             É só isso o que o poeta diz deles. Mas pelas notas dos comentadores – úteis para uma leitura mais prazerosa do poema – ficamos sabendo que Caius Fabricius foi um cônsul romano em 282 a.C. que rejeitou propostas de suborno no exercício de seu alto cargo. E o terceiro exemplo  refere-se a um episódio da vida de S.Nicolau, um bispo do século IV, que teria jogado secretamente pela janela de um vizinho pobre, à noite, sacos de ouro, o que viabilizaria o casamento de suas três filhas, por terem dote, conforme o costume da época, evitando assim que se prostituíssem. S. Nicolau, padroeiro da Rússia, é conhecido nas Américas como Papai Noel (1).   

Hugo Capeto (retrato do séc. XIX)

            Dante pede então que aquela alma – “Ó alma que falas de tão bons exemplos” (O anima che tanto ben favelle- v.34) – diga quem foi, e pergunta porque só ela fala. A resposta desse espírito,  que se identifica como Hugo Capeto, origem da dinastia dos reis franceses então no poder  (“de mim nasceram os Filipes e Luíses”: di me son nati i Filippi e i Luigi- v. 50), sucessora da dinastia carolíngia, estende-se até o v. 123, tendo se iniciado no v.40. Verifica-se assim que mais da metade dos 151 versos do Canto XX consiste em sua manifestação... Essa aliás é uma característica dos cantos, frequentemente apoiados na resposta que o interlocutor dá a uma pergunta de Dante.   

Hugo Capeto  (retrato em códice medieval) 

            Hugo Capeto é muito crítico com relação à sua descendência, cujo comportamento ele censura a partir da obtenção do “grande dote da Provença” (la gran dota provenzale- v. 61), uma referência ao casamento de Charles d’Anjou (1220-1285) com a filha do Conde da Provença (2): “Ali começou com violência e com mentira/ a sua rapina” (Lì cominciò con forza e con menzogna/ la sua rapina; /.../- v. 64-65). Menciona também outras regiões incorporadas ao reino francês. Os versos dizem que ele “sacrificou Conradino” (vittima fé di Curradino- v.68), sobrinho e sucessor do rei Manfredo, a quem Charles d’Anjou também derrotara e cuja morte causara (deste em 1266, na batalha de Benevento, e daquele em 1268, com apenas 16 anos, decapitado após ser preso). Em consequência disso, Charles d’Anjou tornou-se rei da Sicília e da Apulia (3). Além disso, ele “enviou para o céu Tomás, como reparação” (ripinse ao ciel Tommaso, per ammenda- v.69), i.e. Tomás de Aquino (para Dante ele foi responsável por sua morte por envenenamento). A expressão “per ammenda” (“Para/ como reparação”) repete-se três vezes aí, como rima, em dois tercetos (v.64-66 e v.67-69), e é utilizada ironicamente por Dante, como se um malfeito “reparasse” outro...  

            A partir do v.70 o espírito de Hugo Capeto faz previsões para o futuro próximo (como o poema se passa em 1300 e foi escrito alguns anos depois, Dante usa o artifício de prever aquilo que de fato já aconteceu). Diz que vê “um outro Charles” (un altro Carlo- v. 71) sair da França (para entrar na Itália). E prossegue, nestes termos:

Sanz’arme n’esce e solo con la lancia
con la qual giostrò Giuda, e quella ponta
sì, ch’a Fiorenza fa scoppiar la pancia.

Quindi non terra, ma peccato e onta
guadagnerà, per sé tanto più grave
quanto più lieve  simil danno conta.    (XX,  73-78)

Sai sem armas, só com a lança/ com que lutou Judas, e a usa de tal modo/ que faz Florença rebentar a pança.
Disso não terra, mas pecado e vergonha/ ganhará, tanto mais grave para ele/ quanto mais leve considera essa má ação.

            Esse “outro Charles” é Charles de Valois (chamado “Sansterre”, daí a menção a terra no v. 76), que invadiu Florença em 1301 a pedido do papa Bonifácio VIII com o pretexto de pacificá-la, mas na realidade para destituir do poder o partido dos Brancos, o de Dante, causando o seu banimento da cidade (4).  A lança de Judas é referida como metáfora da traição...
  
            Hugo Capeto cita ainda um terceiro Charles no v. 79 (o segundo referido em sua previsão, pois os fatos relacionados ao primeiro já haviam ocorrido).

L’altro, che già uscì preso di nave,
veggio vender sua figlia e patteggiarne
come fanno i corsar de l’altre schiave.    (XX, 79-81)

Outro, que uma vez saiu preso de seu navio,/ vejo vender sua filha, negociando-a/ como fazem os piratas com as escravas.

            Trata-se de Charles II de Anjou (1248-1301), que, interessado apenas no grande dote, casou sua jovem filha com Azzo VIII, velho e malafamado; quando jovem ele sofrera uma derrota naval frente a Pedro III de Aragão e fora feito prisioneiro (5).    

            Após Hugo dirigir-se diretamente à Avareza, personificada, e constatar que ela exerce atração sobre o “seu sangue” (il mio sangue- v.83), ele continua a relatar sua visão (enquanto mantém o tom irônico: note-se o v. 85):  

Perché men paia il mal futuro e ‘l fatto,
veggio in Alagna intrar lo fiordaliso,
e nel vicario suo Cristo esser catto.   (XX,  85-87)

Para que pareça menor o mal futuro e passado/ vejo entrar em Alagna a flor de lis,/ e Cristo ser aprisionado em seu vigário.

            “Flor de lis” aqui representa o rei francês Felipe IV, chamado Felipe o Belo (1268-1314) (6).  Charles de Valois, antes referido, era seu irmão. Esse rei francês tinha desavenças antigas com o papa Bonifácio VIII, a quem chega a aprisionar, por meio de dois de seus aliados, e maltratar, no palácio de Alagna, onde o papa residia (Alagna, atual Anagni, dominada pela família de Bonifácio, era a sua cidade natal). O papa depois foi libertado pela população local. Mas já tinha então cerca de 86 anos, e morreria um mês depois desse incidente. Por isso, Hugo diz que vê Cristo “ser morto entre dois ladrões ainda vivos” (e tra vivi ladroni esser anciso- v.90), referência também àqueles dois aliados de Felipe. Este, chamado “novo Pilatos” (il novo Pilato- v.91), não saciado com tal ato abjeto, ainda “leva seus navios cobiçosos ao Templo” (portar nel Tempio le cupide vele- v. 93), uma alusão ao ataque e às perseguições que empreendeu contra a Ordem dos Templários, interessado em apropriar-se de suas riquezas. Curiosamente, Dante critica o rei francês por não respeitar a figura do papa, que para ele é “o vigário” de Cristo na Terra, distinguindo assim o cargo do seu eventual ocupante, no caso o papa Bonifácio VIII, que ele detestava, responsável pela inversão da situação política em Florença, o que afetou profundamente a sua  vida pessoal.   

            Hugo, depois, refere-se mais diretamente à pergunta de Dante, dizendo que o que ele ouviu “é resposta a nossas preces/ enquanto dura o dia” (tanto è risposto a tutte nostre prece/ quanto ‘l dì dura; /.../- v.100-101). São aqueles três exemplos citados acima da virtude contrária à cobiça/avareza, o primeiro dos quais diz respeito à “única esposa do Espírito Santo” (unica sposa/ de lo Spirito Santo- v. 97-98), i.e. a Maria. Mas quando anoitece, diz ele,  são ouvidos outros exemplos ali, os de avarentos malsucedidos, vítimas de seu próprio pecado. Estes são os sete exemplos a que vai se referir rapidamente, em um ou dois versos: 1) o de Pigmalião (irmão da rainha Dido que matou Siqueu, o marido dela, pela riqueza), 2) o do rei Midas (a quem foi concedido transformar em ouro tudo o que tocasse e que, arrependido, por não poder mais comer, pediu aos deuses para lhe retirarem essa prerrogativa), 3) o de Acan (o personagem bíblico que roubou parte dos despojos da batalha de Jericó destinados a Deus e foi apedrejado por ordem de Josué), 4) o de Safira e seu marido (que reservaram para si parte da venda dos bens da comunidade cristã primitiva, cujos integrantes possuíam tudo em comum; após Safira e o marido serem repreendidos por Pedro, caíram mortos aos pés dele);  5) o de Heliodoro (que ao tentar se apoderar dos tesouros do Templo de Jerusalém foi rechaçado por um cavaleiro angelical cujo cavalo lhe deu coices), 6) o de Polinestro (rei da Trácia, que matou Polidoro, filho de Príamo, para se apoderar do ouro de Troia quando esta caiu) e 7) o de Crasso (membro do triunvirato romano em 60 a.C., juntamente com Pompeu e Júlio César, morto na batalha contra os  partas, cujo rei, sabendo de sua notória cupidez, verteu ouro fundido em sua garganta) (7). A título ilustrativo, veja-se como esse último caso é lembrado em voz alta aos penitentes: “Crasso,/ dize-nos, pois tu o sabes: que gosto tem o ouro?” (“Crasso,/ dilci, che ‘l sai: di che sapore è loro?”- v.116-117). Note-se o tom sarcástico adotado por Dante neste verso (que é mais bem apreciado quando o leitor tem alguma informação sobre Crasso...). Os exemplos citados foram extraídos respectivamente 1) da “Eneida” 2) da mitologia clássica 3) da Bíblia- Velho Testamento 4) da Bíblia- Novo Testamento 5) da Bíblia- Velho Testamento, apócrifo 6) da “Eneida”  e 7) da história romana (8).   

            Hugo Capeto conclui sua resposta a Dante afirmando que não era apenas ele que falava há pouco (sobre os bons exemplos de Maria, Fabrício e Nicolau). Todavia, só ele foi ouvido, porque era o que falava mais alto por ali.

            Os dois poetas então afastam-se dele e prosseguem em seu caminho. Mas de repente sentem tremer o montanha do Purgatório, e Dante diz que isso lhe causa um frio “como sucede àquele que vai ao encontro da morte” (qual prender suol colui ch’a morte vada- v. 129). Depois, de toda parte ouvem estas palavras sendo ditas em voz alta—“Gloria in excelsis Deo” (“Glória a Deus nas alturas”). Elas foram pronunciadas aos pastores pelos anjos quando Jesus nasceu, segundo o evangelho de S.Lucas (8). Por isso, os versos dizem

No’ istavamo immobili e sospesi
comme i pastor che prima udir quel canto,
fin che ‘l tremar cessò ed el compiési.    (XX,  139-141)

Nós ficamos imóveis e expectantes,/ como os pastores que primeiro ouviram aquele canto,/ até que o terremoto cessou, e o canto também.

            Dante afirma que nunca desejou tanto saciar a sua ignorância como naquela hora, relativamente a esses fatos que eles acabaram de presenciar. Mas o Canto se interrompe aqui, deixando o leitor em suspense, curioso pela  explicação. Essa é uma qualidade deste poema narrativo, vale dizer, a de conseguir manter, permanentemente, o interesse do leitor...          


NOTAS


(1) SAYERS, Dorothy L.—“Dante: The Divine Comedy-  II. Purgatory”. Translated by Dorothy L. Sayers.  Penguin Classics, 1963, p. 228-229

(2) Ib ib, p. 230 e 360.

(3) MANDELBAUM, Allen- “The Divine Comedy of Dante Alighieri- Purgatorio”. Bantam Books, 1984- p. 324 e 367

(4) Id. ib, p. 367

(5) Id. ib, p. 367; SAYERS, Dorothy L.—“Dante: The Divine Comedy-  II. Purgatory”, op cit, p. 231

(6) SAYERS, Dorothy L.—“Dante: The Divine Comedy-  II. Purgatory”, op cit, p. 231 e 377

(7) Id. ib, p. 232-233

(8) Id. ib, p. 232-233

(9) MANDELBAUM, Allen- “The Divine Comedy of Dante Alighieri- Purgatorio”, op cit, p. 369.


Salvador Dalí






quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Canto XIX

PURGATÓRIO


Canto XIX

           
            As referências cósmicas e astrológicas dos versos iniciais deste Canto indicam que a hora do dia é a da manhã,  “antes da alvorada” (innanzi a l’alba- v.5) do dia 12 de abril de 1300 (1). Dante está sonhando, e é nessa hora, segundo uma crendice da época, que os sonhos costumam dizer a verdade. Em seu sonho, apareceu-lhe uma mulher balbucente, vesga, manca, maneta e de cor pálida!  Mas o seu olhar fixo nela a transformava numa outra mulher, liberando sua língua, endireitando-lhe o corpo e dando cor ao seu rosto...  Depois, ela afirma ser uma “doce sereia, / que desvia da rota os marinheiros” (/.../ io son dolce serena,/ che ‘marinari in mezzo mar dismago- v. 19-20) com o seu belo canto. E começa a cantar de tal modo que, diz Dante, “seria penoso para mim/ desviar dela a atenção” (cominciava a cantar sì, che con pena/ da lei avrei mio intento rivolto- v.17-18).      

            Mas então “uma dama apareceu, santa e ágil,/ ao meu lado, para confundi-la” (/.../.una donna apparve santa e presta/ lunghesso me per far colei confusa- v.26-27), quer dizer, confundir essa mulher transformada pelo olhar de Dante. E a dama que surgiu se voltava, indignada, para Virgílio, perguntando a ele—“quem é esta?” (chi è questa?- v. 28), ao que o poeta latino reage deste modo:

L’altra prendea, e dinanzi l’apria
fendendo i drappi, e mostravami ‘l ventre;
quel mi svegliò col puzzo che n’uscia.    (XIX, 31-33)

Ele a agarrava, despia-a na frente/ rasgando-lhe as vestes e me mostrava seu ventre;/ e o fedor que vinha dele me despertou.     

            A primeira mulher, aquela de má aparência, representa os pecados do amor excessivo aos objetos terrenos, a saber, a avareza (e seu inverso, a prodigalidade), a gula e a luxúria, punidos nos próximos terraços da montanha do Purgatório a serem visitados. Pois Virgílio dirá ao seu discípulo mais adiante:

“Vedesti”, disse, “quell’ antica strega
che sola sovr’ a noi omai si piagne;
vedesti come  l’uom da lei si slega.    (XIX, 58-60)

Viste”, disse, “aquela antiga feiticeira/ que sozinha faz chorar acima de nós;/ viste como o homem dela se desprende.

            Por outro lado, a “santa dama” que surge e repreende Virgílio (a Razão), pode ser vista como a virtude oposta à incontinência dos sentidos, representada pela primeira mulher. Caberá assim à Razão, aguilhoada pela Virtude, ou por uma tendência nossa instintiva para o bem (2), mostrar a Dante a verdadeira face da outra mulher que o seu olhar amoroso (e autoenganador) criou, após Virgílio despojá-la de sua aparência sedutora. Essa feiticeira desperta então repugnância a Dante, a mesma despertada pelos pecados que representa...

G. Doré- Subida para o 5º terraço

            Dante não acordou por si. Na realidade, foi acordado por Virgílio, que o chama para prosseguirem viagem. Devem encontrar a passagem que os levará ao próximo terraço. Seguem em pleno dia, com o sol às suas costas (o que significa que caminham para oeste).  Eles ouvem então alguém, “Com as asas abertas, que pareciam as do cisne” (Con l’ali aperte, che parean di cigno- v. 46) indicar a passagem, “de modo tão suave e benigno,/ como não se ouve nesta mortal terra” (/.../ in modo soave e benigno,/ qual non si sente in questa mortal marca- v. 44-45). Trata-se do Anjo do Zelo ou da Diligência (a virtude oposta à acídia), presente no terraço que os dois poetas estão deixando. Ele os leva para cima, não sem antes mover as plumas -- cujo movimento apagará mais um “P” da testa de Dante (o que é apenas sugerido no v. 49) – e o anjo afirmar serem abençoados os “qui lugent” (v. 50) (“os que choram”, em latim), pois serão consolados, mais uma das bem-aventuranças citadas.          

            A fronte de Dante estava “como a daquele que a tem carregada de pensamentos,/ e faz de si um semiarco de ponte” (come colui che l’ha di pensier carca,/ che fa di sé un mezzo arco di ponte- v. 41-42), uma curiosa imagem sugerida pelo seu corpo curvado. Ele ainda está pensando naquela “sereia”  e é aí então que Virgílio o esclarece sobre quem ela é de fato, nos versos 58-60 antes transcritos. Recomenda ao discípulo apressar o passo e voltar-se para outro atrativo, o das esferas celestes (“esferas magnas”: le rote magne- v.63), movidas pelo “Rei eterno” (lo rege etterno- v.63), no que é atendido.

            Surge aqui uma comparação interessante, ligada à falcoaria. Assim como o falcão é atraído “pelo desejo do pasto que o atrai” (per lo disio del pasto che là il tira- v. 66), Dante diz que ele também se volta para o seu atrativo (ou alimento) celeste: ele passa, com o ânimo revigorado, a escalar a fenda da rocha e avança “até onde se começa a caminhar em círculo” (n’andai infin dove ‘l cerchiar si prende- v. 69), chegando enfim ao novo terraço. Os comentaristas  afirmam que esse seu ânimo revigorado tem a ver com o fato de que ele já se distancia do terraço dos preguiçosos...

Amos Nattini 

G.Doré- Os avarentos- Adriano V
            O quinto círculo (ou terraço, ou cornija) do “sacro monte” (v. 38) é o dos avarentos/pródigos, onde estes purgam (choram) seu pecado “jazendo na terra de bruços” (giacendo a terra tutta volta in giuso- v.72), com os pés e mãos atados (v. 124).  Virgílio pede a esses “eleitos de Deus” (eletti di Dio- v.76), esperançosos de um dia chegar ao Paraíso, que lhes indiquem o caminho “para os mais altos degraus” (drizzate noi verso li alti saliri- v.78), ou seja, para os próximos círculos. Alguém lhe responde, afirmando que ele deve conservar a sua “direita sempre para o lado de fora” (do monte) (le vostre destre sien sempre di fori- v.81). Dante percebe de onde veio a resposta e se aproxima de quem falou, ali escondido, no meio dos outros.  Dirige-se a ele nestes termos:

/.../ “Spirto in cui pianger matura
quel sanza ‘l quale a Dio tornar non pòssi
sosta un poco per me tua maggior cura.

Chi fosti e perché vòlti avete i dossi
al sù, mi dì, e se vuo’ ch’ io t’ impetri
cosa di là ond’ io vivendo mossi.”    (XIX, 91-96)

Espírito em quem o pranto amadurece/ aquilo sem o qual não é possível retornar a Deus/ suspende um pouco, por mim, teu maior cuidado.
Quem foste tu e por que tens as costas/ voltadas para cima, dize-me, e se queres que eu rogue por ti/ alguma coisa lá de onde, vivo, eu venho”.

            Sem a purgação do pecado não é possível ao pecador entrar no Paraíso. Por isso, ela deve ser “amadurecida” aí, vale dizer, deve cumprir o período de sofrimento que lhe coube. No caso dos avarentos, jazendo naquela posição incômoda... Pois, como dirá esse penitente mais adiante,

Sì come l’occhio nostro non s’aderse
in alto, fisso a le cose terrene,
così giustizia qui a terra il merse.   (XIX, 118-120)

Assim como nossos olhos não se voltaram/ para o alto, fixos nas coisas terrenas,/ assim Justiça aqui os rebaixa para a terra.

            Estão ali de bruços, com o rosto no solo, presos, “com os pés e mãos atados” (ne’ piedi e ne le man legati e presi- v. 124), “imóveis e estirados” (immobili e distesi- v.126). O penitente em questão revela a Dante, em latim, ter sido Papa (v.99). Mas só por um breve período:

Un mese e poco più prova’ io come
pesa il gran manto a chi dal fango il guarda,
che piuma sembran tutte l’altre some.    (XIX, 103-105)

Um mês e pouco provei como pesa/ o grande manto a quem o mantém fora da lama;/ todas as outras cargas parecem plumas.

Adriano V
             Ele é identificado pelos comentadores como Adriano V, que foi Papa apenas por 38 dias e pertencia à rica família dos condes de Lavagna, cujo título tomou o nome do rio que “desce entre Sestri e Chiaveri” (Intra  Sïestre e Chiaveri s’ adima- v.100), cidades próximas a Gênova. Ele diz ainda que a sua conversão foi tardia e só ocorreu quando foi eleito “pastor romano” (roman pastore- v.107).  Até então confessa ter sido um homem avarento.  Descobriu muito tarde “que a vida (terrena) é ilusória” (così scopersi la vita bugiarda- v.108): 

Vidi che lì non s’acquetava il core,
né più salir potiesi in quella vita;
per che di questa in me s’accese amore.   (XIX, 109-111)

Vi que ali não se aquietava o coração,/ nem eu podia subir mais naquela vida,/ pelo que se acendeu em mim o amor por esta.

            Dante então se ajoelha em consideração à dignidade papal. O  penitente, percebendo o seu gesto só pela audição (v. 129), dado o estado em que se encontrava, manda-o levantar-se, afirmando:

“Drizza le gambe, lèvati sù, frate!”
rispuose; “non errar: conservo sono
teco e con li altri ad una podestate.    (XIX, 133-135)

“Endireita as pernas, levanta-te, irmão!”/ respondeu; “não cometas erro: sou também servo,/ contigo e os outros, de uma só Potestade”.

            Lembra, a propósito, uma passagem dos Evangelhos, sugerido pela expressão latina que cita-- “Neque nubent” (v.137). Segundo Mandelbaum et al. (3), ela se refere à resposta de Cristo a uma questão colocada pelos saduceus, quando afirma que, após a Ressurreição, não prevalecem mais os laços do matrimônio. O significado disso, no caso de Adriano V, é que também o seu “casamento” com a Igreja não tem mais sentido após a morte. Logo, ele é um servo a mais de Deus, como qualquer outro espírito.

            No final, Adriano dispensa Dante porque a sua permanência ali perturba o seu pranto, “com o qual amadureço o que disseste” (col qual maturo ciò che tu dicesti- v. 141), vale dizer, a sua penitência. E diz que só lhe restou em nosso mundo uma sobrinha chamada Alágia --  “boa de si; que a nossa casa / não a faça malvada pelo exemplo” (buona da sé, pur che la nostra casa/ non faccia lei per essempro malvagia- v.143-144) --, subentendendo-se, por essas palavras, que ela pode ser solicitada a rogar por ele aqui e abreviar a sua estada no Purgatório...


NOTAS


(1) LONGNON, Henri— “Dante- La Divine Comédie”. Traduction, préface, notes et commentaires par Henri Longnon. Paris: Garnier, 1951- p. 270.

(2) Id. ib., p. 598.  Cf também SAYERS, Dorothy L.—“Dante: The Divine Comedy-  II. Purgatory”. Translated by Dorothy L. Sayers.  Penguin Classics, 1963, p. 221

(3) MANDELBAUM, Allen- “The Divine Comedy of Dante Alighieri- Purgatorio”. Bantam Books, 1984- p. 365


Salvador Dalí


terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Canto XVIII

PURGATÓRIO


Canto XVIII


            Após a exposição sobre o amor feita por Virgílio no canto anterior, Dante ainda continua em dúvidas mas sente-se constrangido em externá-las. Pensa assim: “Talvez perguntar demais o aborreça” (/.../ “Forse/lo troppo dimandar ch’io fo li grava”- v.5-6). Mas seu “pai veraz” (padre verace- v.7), lendo seu pensamento, o estimula a falar, e ele pede então para que Virgílio lhe explique o amor, “ao qual atribuis toda obra boa e o seu contrário (/.../ a cui reduci/ ogne buono operare e ‘l suo contraro- v. 14-15).  

            Antes de iniciar sua nova exposição, o mestre já previne o seu discípulo quanto ao “erro dos cegos que se fazem guias” (l’error de’ ciechi che si fanno duci- v. 18). Segundo o comentadores, Dante-autor critica aqui, pela boca de Virgílio,  os adeptos do epicurismo, para quem, como este dirá adiante, “todo amor é coisa em si louvável” (ciascun amore in sé laudabil cosa- v.36).

            Virgílio começa falando sobre o amor inato, de que toda alma é dotada, ao ser criada. Ele é definido como a inclinação natural da alma ao bem que lhe traz satisfação, “assim como o fogo move-se para cima/ pela sua natureza destinado a subir/ para lá onde dura mais no seu elemento ”:

/.../ come ‘l foco movesi in altura
per la sua forma ch’ è nata a salire
là dove più in sua matera dura     (XVIII, 28-30)

            Note-se nessa passagem a comparação com o fogo, um dos quatro elementos fundamentais da filosofia antiga. E a referência, no v. 30, à esfera de fogo que envolve a Terra (1).

            Mas Dante continua em dúvida. E levanta esta questão ao seu mestre:

/.../ s’amore è di fuori a noi offerto
e l’anima non va con altro piede,
se dritta o torta va, non è suo merto    (XVIII, 43-45)

/.../ se o amor nos é oferecido de fora/ e a alma não anda com outro pé,/ não é seu mérito se vai direita ou torta

            Ou seja, se nossas ações em busca dos bens que nos gratificam já estão predeterminadas por esse amor instilado em nós por Deus, então não há nenhum mérito em nossa conduta, pois ela já estava predeterminada pela natureza. Virgílio admite isso, ao dizer que existem noções inatas no ser humano e uma inclinação por bens

che sono in voi sì come studio in ape
di far lo mele; e questa prima voglia
merto di lode o di biasmo non cape   (XVIII, 58-60)

que estão em vós como nas abelhas/ o desejo de fazer mel; e essa vontade primeira/ não merece nem louvor e nem censura 

            Dante faz uso, nestes versos, dos conceitos de “forma substancial” e “matéria”, referidos explicitamente nos vv. 49 e 50, extraídos da doutrina de S. Tomás de Aquino (2). A primeira é o que dá ao ser existente a sua individualidade, aquilo que o distingue dos demais seres, os quais são concebidos formando uma hierarquia. No topo dela estão os anjos, só forma sem matéria, na base, os entes inanimados. Entre esses extremos há as plantas, os animais e os seres humanos, cuja “forma substancial” é a sua alma (“alma racional”, distinta da “alma sensitiva” dos animais) (3). Conforme o poeta, a “forma substancial” dos seres “nunca se mostra senão pelos seus efeitos,/ como a vida, na planta, pelas suas verdes folhas” (né si dimostra mai che per effeto,/ come per verdi fronde in pianta vita- v.53-54), outra comparação. E ele afirma que é a “forma substancial” do ser humano que explica as suas noções inatas e a inclinação por certos bens, mencionadas acima.  

            Todavia, o ser humano nasce com uma virtude “que aconselha,/ e guarda a porta do vosso conhecimento” (/.../ che consiglia,/ e de l’assenso de’ tener la soglia- v. 62-63).  Essa innata virtù é a razão, ou o livre-arbítrio (libero arbitrio), mencionado explicitamente no v. 74.

Quest’ è ‘l principio là onde si piglia
ragion di meritare in voi, secondo
che buoni e rei amori accoglie e viglia.    (XVIII, 64-66)

Este é o princípio de que deriva/ a avaliação do vosso mérito, segundo/ bons ou maus amores sejam acolhidos ou repudiados.  

            É possível portanto, ao ser humano, escolher um caminho ou outro, e aí reside o mérito de sua conduta, pelo qual será julgado. Dante se satisfaz com essa explicação e afirma que Virgílio  -- “aquela sombra gentil” (quell’ ombra gentil- v.82) de Pietola, sua aldeia natal, próxima a Mantua --  “tinha me livrado do peso que carregava” (del mio carcar diposta avea la soma- v. 84).

Amos Nattini

             Já é tarde, a lua se erguera quase à meia-noite, e Dante fica sonolento. Mas essa sonolência cessa de repente quando ele, olhando para trás, vê uma “grande turba” (turba magna- v.98) vindo correndo, que se aproxima deles. São os penitentes deste novo terraço em que estão.  Dante os compara à multidão de tebanos que acorriam às margens dos rios Imeno e Asopo para cultuar Baco. Mas no caso destes espíritos (que expiam o pecado da preguiça), ele diz que são estimulados pelo “bom querer e justo amor” (buon volere e giusto amor- v. 96).  Dois deles, na frente da turba, “gritavam, chorando” (gridavam piangendo- v. 99):

“Maria corse con fretta a la montagna;
e Cesare, per soggiogare Ilerda,
punse Marsilia e poi corse in  Ispagna.”   (XVIII, 100-102)

Maria correu à montanha;/ e César, para subjugar Lérida,/ primeiro atacou Marselha e depois a Espanha

            No primeiro caso, conforme os comentadores, os penitentes estão se  referindo à visita que Maria, após a Anunciação, apressou-se a fazer a Isabel, também grávida (ela dará à luz João Batista), enfrentando as dificuldades do percurso, conforme o relato bíblico. No outro caso, referem-se a César que, em campanha contra Pompeu e após sitiar Marselha, deixa suas forças aí encarregadas de concluir a operação e corre para a Espanha a fim de combater Pompeu em Ilerda (Lérida).

            Esses são dois exemplos de zelo ou diligência, a virtude oposta ao pecado que é purgado neste terraço, seguindo o padrão dos cantos anteriores (também fazem parte do mesmo padrão os exemplos de punição aos que incorreram no pecado da preguiça citados abaixo).  

            Virgílio pergunta a esses espíritos – cuja punição consiste em mover-se continuamente para compensar “a negligência e demora/ que por tibieza pusestes no bem fazer(/.../ negligenza e indugio/ da voi per tepidezza in ben far messo- v.107-108) -- onde é a próxima passagem para continuar a sua jornada, pois “este que ainda vive” (questi che vive- v. 109), Dante, “quer ir para cima, assim  que o sol rebrilhe” (vuole andar sù, pur che ‘l sol ne riluca- v. 110).  Um daqueles espíritos lhe responde, dizendo para segui-los. E se desculpa assim:

Noi siam di voglia a muoverci sì pieni,
che restar non potem; però perdona,
se villania nostra giustizia tieni.   (XVIII, 115-117)

Nós estamos tão cheios da vontade de mover-nos/ que parar não podemos; por isso, perdoa-nos/ se tomas por descortesia nossa penitência.

Basílica de S. Zeno (Verona) 
             Quem responde diz que foi abade do mosteiro de San Zeno em Verona.  Ele critica “alguém que já está com um pé na cova” (E tale ha già l’un piè dentro la fossa- v. 121) (trata-se de Alberto della Scala, um senhor de Verona) por colocar naquela abadia seu filho ilegítimo, aleijado e de má conduta -- ou como diz, “mal do corpo/ e pior da mente, e mal nascido(/.../ mal del corpo intero/ e de la mente peggio, e che mal nacque- v. 124-125) (4).  

            A multidão passa e Virgílio pede a Dante para prestar atenção na crítica à acídia (5)  que dois deles, no final da turba, ainda fazem:   

Di retro a tutti dicean: “Prima fue
morta la gente a cui il mare s’aperse,
che vedesse Iordan le rede sue.

E quella che l’affanno non sofferse
fino a la fine col figlio d’Anchise,
sé stessa a vita sanza gloria offerse.”   (XVIII,  133-138)

Atrás de todos os outros, diziam:/ “Morreu a gente para quem o mar se abriu/ antes que o Jordão visse os seus herdeiros.
E aquela que não sofreu até o fim/ as dificuldades junto com o filho de Anquises/ rendeu-se a uma vida sem glória” 

            (Note-se nos versos originais a maestria de Dante em explorar, por motivos estéticos, a sonoridade das consoantes f e s ). 

             Esses são os dois exemplos de punição, antes mencionados, dos que  incorreram no pecado da acídia ou preguiça. O primeiro refere-se à punição que os judeus egressos do Egito receberam, após a abertura do rio Vermelho, quando não tiveram a disposição necessária para seguir Moisés até a Terra Prometida. Assim, essa Terra, banhada pelo rio Jordão, só seria vista pela próxima geração, a dos seus descendentes. No segundo caso, a crítica se refere aos homens de Enéas (“o filho de Anquises”) que não quiseram segui-lo até o Lácio, enfrentando as dificuldades implícitas, e permaneceram na Sicília. Deixaram assim de participar da glória de ter estabelecido na península itálica as origens da sociedade que constituiria o Império Romano.    

            Depois que os penitentes se afastam, Dante se entrega aos seus pensamentos, vagando de um para outro, até que adormece.  


NOTAS


(1) Cf. o diagrama que consta em MANDELBAUM, Allen- “The Divine Comedy of Dante Alighieri- Inferno”. Bantam Books, 1982- p.342. Esse diagrama reflete a concepção geral do universo segundo a “Divina Comédia” e inclui a presença dos quatro elementos tradicionais da filosofia antiga —terra, no Hemisfério Norte, água, no Hemisfério Sul, ar e fogo nas camadas que envolvem a Terra, abaixo das esferas celestes, estas abordadas no “Paraíso”. O “Inferno” está situado abaixo da superfície da terra e o “Purgatório”, na única montanha do hemisfério aquático, surgida pelo deslocamento de terra quando Lúcifer despencou do céu.     

(2) MANDELBAUM, Allen- “The Divine Comedy of Dante Alighieri- Purgatorio”, op cit, p.361

(3) SAYERS, Dorothy L.—“Dante: The Divine Comedy-  II. Purgatory”. Translated by Dorothy L. Sayers.  Penguin Classics, 1963, p.211

(4) MANDELBAUM, Allen- “The Divine Comedy of Dante Alighieri- Purgatorio”, op cit, p.362

(5) Acídia é definida no dicionário Aurélio como “Abatimento do corpo e do espírito; moleza, frouxidão”. Dorothy Sayers alerta que ela não é meramente a ociosidade da mente e a preguiça do corpo; diz que é um envenenamento da vontade que começa com a indiferença, estende-se a uma recusa deliberada da alegria e culmina em introspecção mórbida e desespero. Uma forma moderna dela é a aceitação do mal e do erro disfarçada em “tolerância”; outra é a recusa em emocionar-se na contemplação do bem e do belo (“desilusão”); outra ainda é o isolamento do artista e do contemplativo na “torre de marfim” (“escapismo”). Cf. SAYERS, Dorothy L.—“Dante: The Divine Comedy-  II. Purgatory”, op cit, p. 209.    


Salvador Dalí